Depois de estrear em São Paulo, seguir para o Rio de Janeiro e atravessar o Atlântico até Lisboa, Meio do Céu — o mais recente livro do escritor paulista Ubiratan Muarrek — chega agora a Brasília, cidade onde as tensões nacionais ganham contornos ainda mais nítidos.
O lançamento no Recife, cidade natal dos personagens da obra, foi um marco: recorde de público, ampla repercussão na imprensa e destaque em veículos de referência, como o Suplemento Pernambuco. Essa acolhida chancela a ousadia de Muarrek — um autor paulista — em escrever no sotaque recifense e dar protagonismo a personagens nascidos nessa tradição cultural.
O lançamento brasiliense acontece no dia 12 de agosto, às 19 horas, na Circulares Livros (CLN 113 bloco A loja 07, Brasília-DF), com debate entre o autor e Enio Vieira, jornalista e colaborador da Revista Bula, mestre em Literatura Brasileira pela UnB e especialista na produção cultural contemporânea.
Publicado pela Assírio & Alvim, Meio do Céu é escrito em formato de peça teatral, sem narrador, conduzindo o leitor por diálogos truncados e vozes em conflito. A trama se passa em Londres, no dia 25 de julho de 2000, data da queda do avião supersônico Concorde, que matou 113 pessoas — metáfora que marca o início de um século sob o signo da discórdia e do colapso.
No centro da narrativa estão Sofitel e Greta, duas amigas brasileiras — uma negra e uma branca, vindas de um Recife assombrado pela herança da escravidão — que se reencontram em um parque londrino. O dramaturgo Léo Lama definiu o livro como uma “cacofonia de palavras”, na qual os personagens atravessam suas próprias zonas de turbulência histórica e existencial.
A poeta e escritora Tatiana Eskenazi observa que Meio do Céu é “uma mistura entre Esperando Godot e O Auto da Compadecida”, destacando a ousadia do autor em recusar formatos narrativos convencionais e apostar numa linguagem que se torna campo de batalha. Para ela, trata-se de “uma experiência literária vertiginosa e recompensadora, onde personagens recifenses deslocados em Londres vivem um tragicômico labirinto de identidades, racismo e luta de classes”.
A crítica cultural e curadora Angélica de Moraes reforça a leitura, definindo o livro como: “Uma visão ácida entre dois mundos: de onde se veio e onde se está. É o outro, o estranho, o caleidoscópio de uma e muitas realidades. Leiam. Inquietação garantida.”
No horizonte crítico, a ensaísta Flora Süssekind tem identificado uma nova vertente da literatura brasileira marcada pela “coralização” — obras construídas como coros de vozes, muitas vezes dissonantes. Meio do Céu se insere nesse movimento, em uma narrativa de falas fragmentadas e tensas, em que até silêncios ganham peso dramático.
No Suplemento Pernambuco, o livro foi saudado como o trabalho de um “escritor arrojado, que vem construindo uma nova narrativa e linguagem na literatura brasileira”. Em entrevista ao mesmo veículo, Muarrek explicou:
“Aproveitar a riqueza das vertentes faladas do português foi a maneira que encontrei de avançar na minha poética. O português falado do Recife – cheio de história, música e ritmo – foi a língua escolhida para o que, no meu trabalho, foi uma revolução. E, sim, a ideia foi extrapolar o teatro: escrevi um texto para ser lido antes de tudo. A dramaturgia, com seu caráter polifônico e repertório inesgotável, me ofereceu uma chave poderosa para confrontar o Brasil contemporâneo.”
Com carreira consolidada — autor dos romances Corrida do Membro (2007) e Um Nazista em Copacabana (2016), semifinalista do Prêmio Oceanos — Muarrek reafirma em Meio do Céu sua aposta no tragicômico como lente para o Brasil contemporâneo:
“Nas raízes da comédia há uma capacidade de perigo muito mais ameaçadora do que qualquer sentimento gerado pela tragédia. Tempos ameaçadores, arte ameaçadora — ao invés de arte ameaçada.”
Assim, Meio do Céu chega a Brasília não apenas como obra literária, mas como experiência coral, inquietante e profundamente brasileira, capaz de ecoar no centro político do país as vozes que nasceram no Recife e hoje atravessam fronteiras.
Mais sobre Ubiratan Muarrek
Formado em Direito pela Universidade de São Paulo (USP), pós-graduado em Mídia e Comunicação pela London School of Economics e em Dramaturgia pelo Célia Helena, Ubiratan Muarrek é escritor, jornalista e produtor de cinema. É colunista do jornal Público Brasil (Lisboa). Autor dos romances Corrida do Membro (2007) e Um Nazista em Copacabana (2016) — semifinalista do Prêmio Oceanos de 2017 —, Muarrek aposta na tragicomédia como chave para interpretar o Brasil contemporâneo.
Mais sobre Enio Vieira
Jornalista e colaborador da Revista Bula, onde publica desde 2021 textos sobre literatura, cinema, séries e música. Mestre em Literatura Brasileira pela Universidade de Brasília (UnB), com foco em ficção contemporânea, atua há mais de 25 anos em Brasília como jornalista e consultor de comunicação.

Ficha
Título: Meio do Céu
Autor: Ubiratan Muarrek
Edição: 2024
Editor: Assírio & Alvim
Páginas: 210
Serviço
Circulares Livros – Comércio Local Norte 113, BL A, Loja 7 – Asa Norte, Brasília/DF
Terça-feira, 12 de agosto, às 19h